sexta-feira, 4 de maio de 2018

Solstício

Sentado na pedra à beira do rio, escrevo memórias de fantasmas vivos, de locais misteriosos carregados de história e de magia cercados por montanhas e três rios que surgem da milenar memória dos povos, de gente feita de carne, sonhos, ilusões, de terra e de água. De ventos que por aqui passam famintos a gemer loucuras eternas. De barcos a remos que se afundam nos ternos olhos dos pássaros, de árvores centenárias que cantam poemas abraçadas a mim ao amanhecer. Dos verdes e dos azuis com que se fabricam todas as fantasias, de crianças inocentes e puras que alegres, ensaiam pequenos e delicados voos a dois passos dos ninhos. De velhos de olhar meigo e doce plantados no chão bruto da taberna a engolir saudades medonhas, dos  rios que por aqui correm solitários e secam as pedras com lágrimas. De tudo, de nada, do provável, do improvável, das mãos que afagam com ternura os sem abrigo, dos rostos que contam verdadeiras e fantásticas histórias, dos cabelos que o vento agita e são apenas beijos a querer subir ao céu, de sorrisos que nos iluminam e mitigam os instantes de dor e sofrimento, dos que emigraram à procura de pão com lágrimas nas mãos, da despedida das rolas que nos deixam sem luz, da chegada das andorinhas que repõem a alegria e a esperança , do calor intenso do corpo de quem ama, do frio gelado da alma dos sem fé e sem amor, de ti que inadvertidamente criei com poemas de papel, de mim que não me reconheço no incoerente almanaque da vida onde me arrasto, da doçura dos dos beijos, do calor dos abraços, do ontem que perdi para sempre, do hoje que me escapa por entre os dedos, do agora que lesa e ilude porque pode não haver amanhã.
Sentado sozinho na pedra à beira do rio espero o o solstício, o clarão que vem iluminar a terra, anunciar a vitória da luz sobre as trevas e refazer a esperança que se julgava perdida.

Num instante amanheceu sobre o rio!

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